Diagnóstico e Prognóstico de recursos hídricos: Como tomar boas decisões?
ste artigo faz parte de uma coleção de textos sobre disponibilidade hídrica que vem sendo publicados. Para acessar as publicações anteriores e entender o contexto dele nos estudos de disponibilidade hídrica, veja os links abaixo:
- Disponibilidade Hídrica – EcoNumérica Engenharia
- Quantificar Disponibilidade Hídrica – EcoNumérica Engenharia
- As vazões de referência – EcoNumérica Engenharia
- O Balanço hídrico – EcoNumérica Engenharia
O conteúdo desta publicação é voltado ao diagnóstico e prognóstico de recursos hídricos. É uma etapa importante no planejamento e gestão de recursos hídricos e permite que decisões e priorizações sejam organizadas e definidas. Enquanto o diagnóstico envolve as informações existentes e define, basicamente, o passado, o prognóstico busca projetar cenários futuros que podem contribuir para aumentar o consumo da água. A avalição em conjunto do diagnóstico e prognóstico permite avaliar se projeções futuras são coerentes com o que já é conhecido na bacia e como a gestão das águas numa bacia hidrográfica deve ser conduzida.
Diagnóstico de recursos hídricos
A etapa de diagnóstico aponta as condições históricas e atuais da bacia hidrográfica. Ele permite avaliar de forma objetiva, dentro das limitações e incertezas existentes, a disponibilidade hídrica e o balanceamento dos múltiplos usos e como isto está impactando a bacia hidrográfica e suas funções ecossistêmicas. Nesta etapa, o uso de dados históricos e o gerenciamento dos usos é o ponto mais importante.
Disponibilidade hídrica
A primeira etapa do diagnóstico de recursos hídricos é entender a disponibilidade hídrica na bacia hidrográfica sendo avaliada. A disponibilidade neste primeiro momento é o volume que naturalmente estaria disponível na bacia hidrográfica sem que os múltiplos usos fossem considerados. É um processo que determina as vazões que naturalmente escoariam nos rios e estariam disponíveis nos lençóis freáticos se a bacia hidrográfica estivesse em sua forma mais natural possível.
Este diagnóstico da disponibilidade hídrica natural, também chamado de estudos de reconstituição de vazões naturais, representa o cenário de base, aquele que deve ser considerado como pano de fundo para diagnosticar a disponibilidade hídrica na bacia. É ele quem determina as vazões de referência para as quais a bacia hidrográfica mantém suas funções ecológicas naturais.
Usos existentes
A determinação dos usos para não apenas para quantificação dos volumes utilizados, mas também pela caracterização dos usos identificados. É importante ressaltar que os usos podem ser consuntivos (que utilizam a água e alteram seu volume disponível) e não-consuntivos (que utilizam a água, mas não alteram seu volume disponível), sendo o segundo aparentemente de pouco impacto para os recursos hídricos. É um erro pensar desta forma, uma vez que mesmo que o volume se mantenha, independente do uso dado, a existência do uso pode impactar outros atores que também desejam desfrutar dos recursos hídricos existentes.
A identificação dos usos é um trabalho complexo e muitas vezes envolve a inspeção direta do rio. Como esta atividade é virtualmente impossível devido a rios e bacias de grande extensão, pode-se recorrer ao uso de imagens de satélite para esta avaliação. O caminho mais eficaz seria um gerenciamento de usos com base em outorgas e fiscalização, mas há um longo percurso até termos este tipo de controle sobre os nossos recursos hídricos. Mesmo internacionalmente esta realidade ainda é tratada como uma utopia.
Superficial x Subterrâneo
A composição da disponibilidade hídrica na bacia envolve processos superficiais e subterrâneos, o mesmo é válido para seus usos. Bombeamento de água do lençol freático, por exemplo, é uma atividade que muitas vezes não é regularizada mas que ocorre comumente em comunidades e cidades. Identificar os usos e quantificar suas parcelas de contribuição sobre os recursos superficiais e subterrâneos é um desafio aos gestores de bacias hidrográficas.
Devido a dependências dos fluxos superficiais e subterrâneos, com as trocas por infiltração, recarga e escoamento de base, é praticamente impossível determinar o correto diagnóstico de usos de recursos hídricos numa bacia hidrográfica sem a correta integração destes dois ambientes. Para tornar ainda mais relevante esta tarefa, ao balancear os usos existentes quando há estiagens ou períodos secos é comum o complemento dos volumes superficiais com volumes subterrâneos. Ou seja, no planejamento de usos da água numa bacia hidrográfica a complementariedade de fontes de obtenção de água é uma opção relevante.
Balanço Hídrico
Tendo conhecimento das vazões que naturalmente estão disponíveis na bacia hidrográfica, seus principais usos e a interligação entre processos superficiais e subterrâneos é possível elaborar o balanço hídrico. Nesta etapa, a disponibilidade teórica (ou natural) vai sendo descontada dependendo dos usos existentes. Quando há déficit, entende-se que o lençol freático esteja contribuindo para a conta. Quando há superávit, entende-se que a vazão está escoando para jusante, saindo da bacia hidrográfica para um outro rio, lagoa ou mesmo para o oceano.
Conceito final: Está faltando água?
Ao final da etapa de diagnóstico uma pergunta importante é respondida: Está faltando água para algum uso específico da bacia hidrográfica? Se sim, por quanto tempo e quando?
Esta complementação da pergunta, em caso positivo, é resultado da dinâmica temporal do ciclo hidrológico. Ao calcular disponibilidade hídrica utilizando vazões de referência estamos assumindo que há um risco desta vazão não estar disponível. Nestes momentos, é importante entender quais usos são impactados e se é possível a compensação desta falta em períodos de chuva, quando o volume disponível tende a ser maior.
Prognóstico de recursos hídricos
Prognósticos buscam criar cenários para tomada de decisão com base em condições futuras. Geralmente, para fins de planejamento, os prognósticos consideram cenários com base no consumo e disponibilidade das águas para uso. Os cenários variam entre pessimista (maior consumo e menor disponibilidade) e otimista (maior disponibilidade e consumo igual ou inferior ao atual), com uma escala de dois ou três cenários intermediários balanceando condições que alterem o volume de água utilizado ou disponível.
O grande desafio dos prognósticos é a idealização de um cenário futuro. Por isso o conceito de risco aqui é importante, uma vez que os cenários futuros possuem uma chance de ocorrer, mas também uma chance de não ocorrer, ou de falhar. Logo o risco associado a cada cenário projetado para o futuro é estimado e avaliado em conjunto com os resultados obtidos. No final da realização de um prognóstico dificilmente há apenas um caminho, ou uma decisão, a seguir. Pelo contrário, o trabalho é realizado para dar elementos que permitam ter uma faixa de decisões que permitam equilibrar elementos positivos e negativos, encontrando uma tomada de decisão de melhor compromisso com a qualidade ambiental e os funcionamentos ecossistêmicos da bacia hidrográfica.
Projeções climatológicas futuras
O grande desafio ao estimar cenários futuros é entender como será o clima nos anos que estão por vir. Projeções climáticas de precipitação e evaporação (ou evapotranspiração) devem considerar não apenas o histórico destas séries e seus cenários hidrológicos, mas as anomalias climáticas (naturais e antrópicas) que podem vir a acontecer. Este tema é alvo de pesquisas em todo o mundo e não há um cenário padrão que seja confiável e aplicável a todos as bacias hidrográficas.
Tradicionalmente as projeções climáticas consideram os cenários climáticos derivados do IPCC, que consideram mudanças industriais e da sociedade e como elas impactam o clima. Estes cenários são construídos com base em diversos modelos climáticos globais, que geram as principais forçantes meteorológicas estimadas, das quais a precipitação é apenas uma delas. Os modelos apresentam simulações históricas e futuras, consolidando cenários que representam o que já aconteceu e cenários que representam o que pode acontecer.
Além da incerteza sobre as projeções futuras nos múltiplos modelos existentes (que as vezes apresentam resultados contraditórios), há também uma incerteza na representação de cenários passados por parte destes modelos. Logo, a avaliação de projeções futuras passa também pela correção de viés nos cenários históricos que estes modelos representam. Como comentei anteriormente, a projeção de cenários hidrológicos futuros é um tema em aberto e ainda necessita de esforços para sua melhoria e redução das incertezas existentes.
Cobertura vegetal
Além das projeções climáticas para o futuro, que geram as condições de precipitação sobre o solo da bacia hidrográfica e por consequência, as vazões disponíveis para os múltiplos usos, a própria bacia hidrográfica pode sofrer alterações. O uso e cobertura do solo na bacia é um dos pontos mais importantes na geração de escoamento superficial. Dependendo da vegetação existente, a água pode escoar mais, infiltrar mais, evaporar mais e assim alterar todo o ciclo hidrológico existente.
Na etapa de prognóstico é importante avaliar a cobertura vegetal atual e estimar uma possível alteração nesta cobertura para o futuro. Por exemplo, é comum que ocorra a alteração entre floresta densa para pecuária, ou a redução de pastos pela urbanização de uma determinada região. Esta alteração na vegetação superficial altera a disponibilidade hídrica na bacia hidrográfica.
Crescimento populacional
Povoados viram municípios que se tornam cidades. Este crescimento na urbanização ou na industrialização de uma região é parte da consequência do aumento populacional. Naturalmente, a população vai aumentar devido as taxas de natalidade e a redução nas taxas de mortalidade, tornando não apenas a população maior em números absolutos (mais gente nascendo do que morrendo) mas também aumentando o tempo de vida dos seres humanos. A tendência futura é que haja um aumento na população e um amadurecimento da mesma, o que impacta diretamente no tipo de uso da água e na necessidade de água para sustentar este crescimento.
Desastres naturais e antrópicos
Um detalhe difícil de avaliar é a ocorrência de desastres naturais que alterem substancialmente a disponibilidade hídrica numa bacia hidrográfica. Locais com histórico apresentam informações que podem ser utilizadas, mas locais onde nunca houve registro de um desastre podem dificultar ou até impedir que os prognósticos considerem estas opções.
Desastres antrópicos, como rompimento de barragens, podem ser avaliados e projetados para considerar seus possíveis impactos sobre os recursos hídricos e gerar planos de ação que mantenham a sustentabilidade e parte das funções ecossistêmicas da bacia hidrográfica.
Novos usos ou aumento dos atuais
Projetar os usos de recursos hídricos deve considerar alterações nos volumes utilizados ou a criação de novos usos. Por exemplo, podemos lançar efluentes numa região da bacia que nunca havia sido utilizada para isto, ou construir um canal de navegação num rio que será utilizado para isto pela primeira vez. O mapeamento de novos usos e a projeção de alterações em usos atuais é realizada com base no conhecimento dos principais atores existentes na bacia hidrográfica.
De forma prática, é importante setorizar as demandas por clusters específicos – irrigação, abastecimento, amortecimento de cheias, dentre outros – e avaliar seus possíveis planos de expansão e como isto impacta os recursos hídricos locais. A expansão de uma operação pode levar a aumentar a necessidade da água, ou aumentar o reuso e reduzir o consumo por meio de métodos operacionais mais eficientes. O mesmo acontece com usos de grande escala, que podem sempre aumentar ou reduzir a necessidade de uso das águas.
Independente do plano de expansão existente, é importante integrar todos os setores de interesse existentes na bacia hidrográfica e entender seus planejamentos. Esta integração é de suma importância para conseguir estimar como o volume de água disponível será utilizado no futuro.
Conceito final: Vai faltar água?
O prognóstico de recursos tem por objetivo responder a um questionamento objetivo: Vai falar água na minha bacia? Para responder esse questionamento essa ferramenta utiliza as informações atuais e futuras, estimando possíveis alterações nas demandas hídricas que podem ocorrer num futuro próximo. Geralmente se utilizam horizontes futuros como cinco, dez e quinze anos (podendo ir até mais), sendo recomendando manter uma coerência com a realidade local da região de estudo. Por exemplo, se foi observado uma forte alteração no desenvolvimento da região no período atual, normalmente cenários com horizonte maior que 10 anos servem apenas para constar nos estudos, pois não dificilmente irão representar a dinâmica do desenvolvimento local.
Outra característica dos estudos de prognóstico são as cenarizações. Normalmente são escolhidos cenários específicos ponderando condições com aumento ou redução de disponibilidade e demanda. Estes cenários, junto com os horizontes de análise, permitem ter conhecimento suficiente sobre a região para tomar decisões coerentes com o desenvolvimento econômico local.
O que fazer com estas informações?
As etapas de diagnóstico e prognóstico são realizadas do ponto de vista técnico, identificando as condições atuais e projetando condições futuras. Estas etapas são complementadas por ferramentas políticas, que buscam articular os interesses dentro da bacia hidrográfica e identificar quais usos são mais relevantes e quais usos causam maior impacto na disponibilidade hídrica. Essa consulta pública e/ou articulação com atores-chave é realizada antes de se criar os planos de ação, programas e instrumentos legais que farão com que o planejamento dos recursos hídricos seja feito de forma participativa. A participação dos diversos atores é a base para que o plano venha a ser executado de forma satisfatória e a bacia hidrográfica não sofra com conflitos pelo uso da água.
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